Introdução
A Bunge Brasil possui unidades e centros de distribuição,
escritórios comerciais, estrutura portuária, industrialização de soja
e trigo, mineração, produção de lecitinas, margarinas e maioneses,
refino de óleo e produção de gorduras, unidades misturadoras de
nitrogênio, fósforo e potássio (macronutrientes de fertilizantes) (Bunge. Brasil, 2013, p. 47). Ao todo, são mais
de 100 instalações, entre fábricas, usinas, moinhos, portos, centros
de distribuição e silos, em 17 estados das cinco regiões brasileiras e
no Distrito Federal (Bunge. Brasil, 2014, p. 9).
A Bunge chegou ao Brasil associando-se ao Moinho Santista, em
1905, e cresceu diversificando atividades, comprando concorrentes,
fazendo joint-ventures, inovando e lançando novos produtos.1 Passados mais de cem anos, já na
década de 1990, a Bunge Brasil era um grupo econômico formado por 127
empresas, todas atuando de maneira independente e com suas próprias
marcas e identidades corporativas (Bunge. Brasil, 2013,
p. 31; Calais, 2017).2
A Sociedade Algodoeira do Nordeste Brasileiro, S. A.
(Sanbra), que será estudada neste artigo, era uma destas subsidiárias,
que chegou a constar entre as 30 maiores firmas do país, junto com o
Moinho Santista e o Moinho Fluminense (portanto, a Bunge tinha três
empresas entre as 30 maiores do Brasil), além de ser a maior
exportadora de produtos do agronegócio e a terceira maior exportadora
nacional nos anos 1970. Desde o início, ela foi a responsável pela
atuação da Bunge Brasil no agronegócio algodoeiro, assim como no setor
exportador.
Em que pese tamanha pujança no cômputo das empresas
exportadoras nacionais, a bibliografia apresenta lacunas no
entendimento de como se formou a Sanbra –na década de 1920 na cidade
do Recife (estado de Pernambuco)– e quais os fatores que a tornaram
uma das maiores firmas do agronegócio brasileiro. Trabalhos como de Pinto (1969), Boldrin (2011)
e Bini (2009) abordam a participação da Sanbra como
firma exportadora de algodão e sisal em momentos específicos do século
xx, em análises
setoriais destes negócios agrícolas, sem efetuar um trabalho de maior
monta sobre a Sanbra e suas empresas. Da mesma forma, há trabalhos
como os de Shurtleff e Aoyagi (2009, 2016) que abordam a Sanbra como exportadora do agronegócio
brasileiro nas décadas de 1950 a 1970 –destacando a exportação de
soja– mas, que o fazem de maneira diminuta, resumindo em poucas
palavras o que foi toda a trajetória da empresa no século xx.
Diante desta lacuna, o objetivo principal deste artigo é
explicar como a Sanbra, uma das subsidiárias da Bunge Brasil,
constituiu-se num grupo econômico. Para tanto, será reconstituída sua
história, desde a origem em Recife, em 1923, até o ano de 1994 quando,
na reestruturação promovida pela Bunge, tal firma foi incorporada em
outro setor de atividade. A pergunta chave que buscaremos responder é:
quais fatores levaram a Sanbra a se transformar num grupo econômico,
ou seja, como se formou um grupo nas entranhas de um já existente, a
própria Bunge Brasil? O artigo investigará tanto a diversificação de
atividades, o reinvestimento do capital próprio, a ocupação do
território nacional, o faturamento no mercado interno e externo, seu
relacionamento eventual com os órgãos de financiamento governamentais
e, ademais, o lançamento de novos produtos como razões principais para
transformar-se em um grupo econômico.
Com base em dados utilizada foi montada a partir de consulta
a documentos primários disponíveis no Centro de Memória Bunge, na
cidade de São Paulo. O artigo inicia com uma revisão teórica tratando
dos autores que abordam a formação de grupos econômicos em economias
periféricas. Segue mostrando como se constituiu a firma e sua atuação
nas primeiras três décadas. Na terceira parte, destaca os motivos que
a levaram a se transformar em um grupo econômico e finaliza com as
conclusões.
Formação de grupos
econômicos em economias periféricas
Segundo Colpan e Hikino (2010), os grupos
econômicos se fizeram presentes como forma organizacional das empresas
de economias, hoje tidas como emergentes, no decorrer do século xx, tendo um papel
destacado no processo de industrialização de países como Brasil,
Argentina, Chile, Coreia do Sul, China, Índia, México e outros.3 Os grupos econômicos seriam uma
resposta às imperfeições das economias de países atrasados: nações com
baixa integração do mercado interno, escassez de fontes energéticas e
creditícias, economias pouco industrializadas e com mão-de-obra
concentrada no campo (Leff, 1974, p. 527; Valdaliso, 2002, p. 587).4
Em que pesem as discordâncias acerca das definições,
convencionou-se denominar como grupos econômicos a reunião de empresas
juridicamente independentes que atuam de maneira conjunta, pois estão
vinculadas de maneira formal (relações contratuais, patrimônio,
controle do capital) ou informal (laços familiares) (Carney et al., 2011, p. 437; Gonçalves,
1999, p. 181; Khanna e Yafeh, 2010, p.
576; Yaprak e Karademir, 2010, p. 247; Colpan, Hikino e Lincoln, 2010, p. 6).5
Para Guillén (2000), os empresários criam
grupos econômicos se as condições políticas e econômicas lhes permitem
adquirir e manter a capacidade de combinar recursos –insumos,
conhecimentos e mercados– para entrar em novos setores de atividades.
A capacidade para combinar de forma rápida e eficiente estes recursos
é genérica (na medida em que pode ser empregada para entrar em
qualquer setor) e, ao mesmo tempo, muito específica de cada grupo.
Inclui aspectos intangíveis: contatos, acesso a linhas de crédito
privilegiadas e know how; e tangíveis: serviços, fatores e
produtos, que podem proporcionar vantagens às empresas que já
pertencem ao grupo.
Para Amsden e Hikino (1994, 1997), que basearam seus estudos em países de
industrialização tardia (Coreia do Sul), a vantagem mais importante
dos grupos sobre as empresas especializadas reside na disponibilidade
de uma capacidade para executar projetos, que foi adquirida em
atividades anteriores e que podem usar para entrar em novos setores
onde não existem firmas estabelecidas.
Ademais, uma importante fonte de crescimento aos grupos
econômicos pode vir de seu alinhamento às políticas nacionais
desenvolvidas pelo Estado. No caso da América Latina –em países como o
Brasil– o projeto de desenvolvimento econômico tendo como fio condutor
a industrialização, a partir da década de 1930, foi realizado com uma
participação estatal na economia que, na tentativa de internalizar
setores industriais, estimulava a formação e atuação de grupos
econômicos, tanto nacionais quanto estrangeiros, em seu modelo de
state-led industrialization (Bértola e
Ocampo, 2012, p. 138; Guillén, 2000, p.
366; Ocampo e Ros, 2011, pp. 4-14; Schneider, 2010, p. 662).
A organização destes grupos, segundo Colpan,
Hikino e Lincoln (2010, p. 16), deu-se pela escolha de uma
estrutura de propriedade piramidal, em que no vértice encontra-se uma
empresa central (holding) –podendo ser uma família a
controlar esta holding– a liderar as subsidiárias que atuam
em setores cuja produção tende a ser não-relacionada, ou seja, há uma
propensão dos grupos econômicos à diversificação produtiva.6 Esta tendência à formação de
subsidiárias e à diversificação de produtos é característica dos
grupos econômicos e lhes permitia: atuar em diversos setores; obter
economias de escala e escopo através da melhor utilização de recursos
internos; maior poder de mercado; diminuição de riscos; ganhos de
aprendizado; além de maiores fontes de capitalização do grupo através
dos lucros de suas subsidárias –compensando prejuízos com outras
empresas do grupo (Delios e Ma, 2010, p. 721; Khanna e Yafeh, 2010, p. 579; Morck, 2010, p. 609).
No caso do Brasil, os grupos econômicos caracterizam-se pela
atuação em, ao menos, três ramos industriais, sendo esta
diversificação uma resposta às falhas de mercado –por exemplo, um
incipiente mercado de capitais– que levou à formação de grandes e
diversificados grupos econômicos, como a Bunge Brasil, em que a Sanbra
era uma das subsidiárias (Aldrighi e Postali, 2010, p.
371) (ver tabela 1).7
Tabela 1
Grupo Bunge no Brasil,
1905-1955
Ano |
Empresa |
Principal
atividade |
Localização |
1905 |
Moinho Santista |
Farinha e derivados de
trigo |
Santos, São Paulo |
1914 |
Moinho Fluminense |
Farinha e derivados de
trigo |
Rio de Janeiro |
1914 |
Grandes Moinhos do
Brasil-Moinho Recife |
Farinha de trigo,
derivados e estrutura portuária |
Recife, Pernambuco |
1923 |
Sociedade Algodoeira do
Nordeste Brasileiro, S. A. (Sanbra) |
Descaroçador de algodão,
fábricas de sabão e de fertilizantes; fábricas de
óleo de algodão, amendoim e mamona; moinhos de
arroz; tanque de óleo para exportação |
Nordeste do Brasil e
forte atuação em São Paulo e Paraná |
1929 |
Sanbra |
Salada: 1º óleo vegetal
do Brasil (algodão) |
Brasil todo |
1929 |
Moinhos Rio Grandenses,
S. A. (Samrig) |
Farinha e derivados de
trigo |
Porto Alegre, Rio Grande
do Sul |
1934 |
Bunge |
Início das exportações:
algodão e café |
Nordeste e Santos, São
Paulo |
1934 |
Moinho Santista |
Fiação de lã |
Belenzinho, São Paulo
|
1936 |
Sociedade Brasileira de
Cimentos (Sibra) |
Exploração de cimentos |
Belenzinho, São Paulo
|
1938 |
Serrana |
Fertilizantes |
Cajati, São Paulo |
1947 |
Manah |
Fertilizantes |
Descalvado, São Paulo
|
1950 |
Moinho Santista |
Propaganda, inauguração
TV no Brasil |
São Paulo |
1955 |
Fundação Bunge |
Apoio a artes, letras,
ciências e atividades comunitárias |
São Paulo |
Bunge Brasil é um típico exemplo destes grupos; sua atuação
se dava em diferentes setores: trigo, milho, café, algodão, sisal,
mamona, oiticica, arroz, na industrialização e nas exportações;
têxtil, químico, alimentício, cimento no setor industrial, para o
abastecimento do mercado interno e exportações; logístico, com atuação
nos aspectos rodoviário, ferroviário e marítimo; entre outros.
Para entendermos o tamanho e a significação das empresas do
Grupo Bunge no Brasil, basta analisarmos o tamanho de algumas delas,
comparadas com as maiores firmas (ver tabela 2).
Tabela 2
Valor de mercado das empresas
abertas de 1988
Entre 100
maiores |
Empresa |
Dólares |
1 |
Petrobras |
1 372 258 256 |
31 |
Moinhos Santista |
162 861 888 |
32 |
Moinho Fluminense |
161 454 182 |
100 |
Banco Mercantil |
31 057 446 |
s. d. |
Grupo Bunge |
s. d. |
s. d. |
Sanbra |
s. d. |
Ao mesmo tempo, estas empresas subsidiárias estavam sob o
comando econômico e dirigidas por três famílias: Bunge, Born e Hirsch.
Ao analisarmos de forma separada uma destas subsidiárias, a Sanbra,
como faremos doravante, notamos que sua expansão foi também no sentido
de se transformar em um grupo econômico –com suas próprias
subsidiárias-coligadas– mantendo relações com a Bunge Brasil, ao mesmo
tempo em que esta mantinha relações financeiras, executivas, de
assistência técnico-operacional com a matriz Bunge e Born argentina e
aquela, por sua vez, com a Bunge de Antuérpia (Barbero,
2013; Born, 2008; Bunge.
Brasil, 2013, p. 231; Green e Laurent,
1989; Silva e Costa, 2015).
Constituição e início de
atividades da Sociedade Algodoeira do Nordeste Brasileiro, S. A.
A Sociedade Algodoeira do Nordeste Brasileiro, S. A.
(Sanbra), como seu próprio nome diz, iniciou com atividades no ramo do
algodão. Seu histórico teve início quando surgiu, em 1919 no Recife, a
firma Cavalcanti & Cia. Em seguida, “a Bunge adquire a empresa
Cavalcanti & Cia. que, em 1923, mudaria seu nome para Sanbra,
tornando-se a primeira empresa da Bunge no segmento de oleaginosas”
(Bunge. Brasil, 2012). Na mesma época de seu
surgimento, “o caroço de algodão passou a ser usado para fins
alimentares, através da extração e do refino do óleo” (Sanbra, 1973b, pp. 12 e ss.).8
Com apenas seis anos de existência a nova firma já lançava um
produto pioneiro no mercado para atender à demanda doméstica. “Em 1929
a Sanbra lança o Salada, de algodão, primeiro óleo vegetal
comestível fabricado no país. O óleo revolucionaria os hábitos
alimentares de consumidores que na época usavam banha de porco” (Bunge. Brasil, 2012).
Para industrializar o caroço de algodão, a Sanbra implantou
seu parque industrial no distrito de Areias, em Recife. Do caroço,
além do óleo comestível e margarina, sabão, glicerina e outros
produtos industriais, produzia torta e farelo, utilizado como ração
animal e no preparo de fertilizantes
Em Campina Grande, na Paraíba, a Sanbra “instalou-se em
1935-1936 com um escritório de compra de algodão em pluma e mamona em
bagas. Em fins de 1949 começou a operar a sua fábrica de óleos” (Sanbra, 1975b, p. 22). Pelos dados da revista,
em 1975 o seu complexo industrial permitia o esmagamento de caroço de
algodão, semente de oiticica,9 amêndoas
de babaçu10 e tucum,11 além de soja. Em 1958 teve suas
instalações ampliadas, atingindo a capacidade de 130 t. per dia de
caroço de algodão. Seus principais produtos eram óleos brutos, farelo,
casca e linters. Normalmente, os óleos brutos eram transferidos para a
refinaria de Areias, no Recife, enquanto o farelo de algodão era
exportado. As instalações de Campina Grande, na Paraíba, empregavam,
em 1975, mais de 200 pessoas.
Uma vez instalada no Nordeste, a Sanbra permanecia atenta às
atividades de produção de algodão das demais regiões. O governo do
estado de São Paulo, principal centro industrial brasileiro nos anos
1920 e importante produtor nacional de algodão, promoveu pesquisas e
gerou melhorias na qualidade das fibras, melhorou as sementes e as
distribuiu em grandes quantidades, posibilitando um sensível aumento
na produção algodoeira (Dean, 1971, p. 20).12
Com o avanço do algodão no estado de São Paulo na década de
1930, a Sanbra expandiu suas atividades em direção a este estado e ao
sul do país. “Em 1934 arrendou quatro usinas em Araraquara, Agudos,
Cerqueira Cesar e Pirajuí. Em 1935 adquiriu sua primeira máquina de
beneficiar aldogão em São Paulo, na cidade de Pederneiras. No Paraná,
em máquina arrendada, na cidade de Wenceslau Braz, já em 1938
beneficiava algodão” (Sanbra, 1973c, p. 13).
A atuação em São Paulo e Paraná foi tão significativa que,
combinando o volume de mercadorias adquiridas com sua
industrialização, geração e comercialização de subprodutos, fez com
que, em 1941, a sede da Sanbra fosse transferida para São Paulo.13 A expansão do grupo ficou marcada
pela operação de aumento de seu capital em 21 de março de 1942, quando
passou de 5 000 contos (Rs. 5.000:000$000) de réis para 20 000 contos
(Rs. 20.000:000$000), através da subscrição de 15 000 contos feita por
dois acionistas: a Sociedade Anônima Moinho Santista com 10 000 contos
e a Fábrica de Tecidos Tatuapé, situada na cidade de São Paulo, com 5
000 contos, sendo estas firmas duas subsidiárias do grupo Bunge Brasil
(“Ata da Assembleia Extraordinária”, 1942, p.
32).14
Continuando sua expansão, em 1948 a Sanbra instalou no
distrito do Jaguaré, na cidade de São Paulo, uma fábrica e uma
refinaria de caroço de algodão. É interesante notar que a atuação
empresarial é dinâmica e vai seguindo o curso das culturas e da oferta
de matéria prima, como descrito pelos dirigentes: “as usinas de
beneficiamento de algodão foram sendo instaladas, acompanhando a
migração da cultura do algodão, sendo montadas e desmontadas à medida
em que aumentava a produção numa região e diminuía em outra” (Sanbra, 1973c, p. 13).
Mantendo este mesmo espírito de acompanhar o deslocamento da
produção pelo país, em 1956, de acordo com a mesma fonte, pelo aumento
da produção no Paraná, a Sanbra construiu sua primeira usina em
Maringá. Em seguida, unidades descaroçadoras de algodão foram montadas
em Cianorte, Paranavaí, Assaí, Umuarama, Guaraci, Iporã, etc. Essas
usinas criaram as condições para a edificação da Fábrica de Óleos de
Maringá, cuja construção começou em 1960.
No estado de São Paulo, uma das cidades em que a empresa
manteve maior presença e atuação foi Presidente Prudente. De acordo
com Mendonça e Costa (2014, p. 10), neste
município, “a Sanbra localiza-se na vila Maristela, na confluência das
Ruas Alvino Gomes Teixeira com a Rua José Claro, às margens da linha
férrea”. Esta localização era estratégica tanto pelo acesso à matéria
prima, quanto pela via de escoamento dos produtos e proximidade com as
demais indústrias de beneficiamento agrícola.
A Sanbra inaugurou sua atuação na cidade “em 1948, com
atividades voltadas ao descaroçamento de algodão. No auge da produção,
na década de 1950, a unidade chegou a contar com cerca de 300
funcionários”15 (“MPE cobra a revitalização de estrutura da Sanbra. Presidente
Prudente,” 2014).
Além do algodão, a Sanbra começou a construção de refinarias
, p. 1bpara industrializar amendoim. “Em 1948 foram construídas três
fábricas em Marília, Presidente Prudente e São Carlos, a primeira
trabalhando só com amendoim e as outras duas também com caroço de
algodão” (Sanbra, 1973a, p. 4). Pelos dados da
mesma fonte, em março de 1953, a Sanbra adquiriu as fábricas de
Ribeirão Preto, Bauru e Ourinhos e instalou uma refinaria de óleo em
Tatuapé, bairro da cidade de São Paulo. Em 1951, inaugurou a Fábrica
de Óleo de Campina Grande, na Paraíba
Analisando a atuação da Sanbra a nível nacional, é possível
perceber como foi construindo, nas suas primeiras três décadas
(1923-1953), uma rede abrangente, atendendo todo Brasil. São Paulo,
tanto em função da produção de algodão –e outros produtos também
industrializados pela Sanbra, como amendoim, mamona, arroz e milho–
como pela sua importância em termos de indústrias e de mercado
consumidor, tornou-se o centro de suas atividades. Neste estado
passaram a funcionar “7 fábricas de óleo de amendoim e caroço de
algodão, 1 fábrica de óleo de mamona, 2 moinhos de arroz, 30
descaroçadores de algodão, 7 depósitos, 1 tanque de óleo para
exportação, 3 prensas de alta densidade, 3 refinações de óleos
vegetais e fábricas de sabão” (Sanbra, 1954).
Enquanto São Paulo destacava-se pela quantidade de
instalações, Pernambuco tomou a dianteira no sentido da
diversificação, constituindo-se no estado em que a Sanbra mantinha
quantidade maior de itens comprados, produzidos e comercializados.
Entre suas atividades, destacavam-se “5 depósitos, 3 descaroçadores de
algodão, 1 fábrica de óleo de algodão, 1 fábrica de óleo de mamona, 1
tanque de óleo para exportação, 1 prensa de alta densidade, 1 fábrica
de óleo de extração por solvente, 1 fábrica de fertilizantes, 1
refinação de óleo e 1 fábrica de sabão” (Sanbra,
1954).
Mesmo com um volume e uma diversificação de atividades menor,
a Sanbra fez-se presente em diversos outros estados, a saber: Paraíba,
onde contava com “9 depósitos, 6 descaroçadores de algodão, 1 prensa
de alta densidade, 1 fábrica de óleo de caroço de algodão”. Na Bahia
detinha “2 depósitos”, enquanto outros três estados do nordeste
contavam com apenas uma atividade, ou seja, “1 depósito em Alagoas,
Rio Grande do Norte e Ceará” (Sanbra, 1954).
Campina Grande, na Paraíba, era conhecida como a Liverpool
brasileira, considerada o segundo pólo de comércio de algodão a nível
internacional. Foi atrás desta produção de matéria prima que a “Sanbra
chegou à cidade em 1935, onde construiu uma grande estrutura” (Araújo e Sousa, 2015). Neste local operou um
depósito, um descaroçador de algodão, uma prensa de alta densidade e
uma fábrica de óleo de caroço de algodão
Na década de 1940 a Sanbra iniciou, em Recife, a extração do
óleo de mamona. Para tanto, adquiriu no bairro de Boa Viagem, uma
fábrica de óleo cujas instalações permitiram o iníco da atividade,
“até a construção de nova fábrica no bairro industrial de Areias,
inaugurada em 1948”. Dando continuidade à produção, a Sanbra iniciou,
em 1955, a construção de nova fábrica de óleo de mamona em Salvador
(Sanbra, 1968).
Sanbra transforma-se em
grupo econômico na segunda metade do século xx
Em seguida o texto buscará esclarecer os principais elementos
que levaram a Sanbra a transformar-se em grupo econômico. Dentre eles,
destacam-se a diversificação de atividades e produtos; o
reinvestimento do capital próprio; a ocupação do território nacional;
as exportações e o faturamento no mercado interno.
Sanbra cresce
diversificando atividades, produtos e ocupando território
nacional
Como já foi mencionado, a Sanbra iniciou suas
atividades no ramo do algodão em 1923. De acordo com Delios e Ma (2010), um grupo econômico
pode crescer através da diversificação de suas atividades,
forjando uma estrutura industrial mais integrada, por exemplo,
rumando em direção à garantia do fornecimento de sua matéria
prima.
Analisando a documentação, percebe-se que a Sanbra
atuava tanto para frente como para trás na cadeia produtiva.
Começava pela parte genética de seleção, multiplicação e
distribuição de sementes de mamona e outros vegetais através de
seu Departamento Técnico Agronômico, cujos integrantes estavam
capacitados a prestar a assistência técnica necessária aos
agricultores e às entidades envolidas com a produção agrícola.16 “Além desta ação direta a
Sanbra participa do Infaol –Instituto Nordestino para o Fomento de
Algodão e Oleaginosas–, entidade criada sob inspiração direta da
Sanbra e que atualmente atua em nove estados nordestinos, com o
apoio das Secretarias de Agricultura destes Estados, do Conselho
Monetário Nacional e dos Bancos Central, do Brasil e do
Nordeste” (Sanbra, 1975a, p. 23).
Uma vez garantida a qualidade, distribuição e produção
da matéria prima, era necessário encarregar-se da sua compra
junto aos produtores, tanto no Nordeste como nos demais estados
do Centro-Oeste, Sudeste e Sul onde passou a atuar. Após longo
processo de melhoramento e extensão de sua rede, as agências de
compras chegaram a um total de 30, presentes em nove estados,
com destaque para o Paraná (catorze) e São Paulo (dez) (ver tabela 2 e mapas 1 e 2).
Depois de adquirida a matéria-prima, o proceso de
industrialização iniciava-se com a separação do caroço e da
pluma. Para esta finalidade, a Sanbra chegou a contar no início
da década de 1980 (ver tabela 2), com 25
usinas de beneficiamento de algodão em nove estados.
O parque fabril da Sanbra contava com nove plantas
industriais entre fábricas de óleos comestíveis e industriais;
refinarias de óleos comestíveis, em cinco estados. Neste caso, a
diversificação de produtos apresenta outros aspectos, uma vez
que tais plantas industriais também estavam capacitadas para
produzir óleos e demais subprodutos, além do algodão, a partir
do milho, amendoim, oiticica, mamona e arroz. Desta maneira,
conforme a quantidade produzida em cada safra e a
disponibilidade de outras matérias primas, a Sanbra aproveitava
tanto suas instalações industriais, máquinas e equipamentos,
como seus operários para diminuir o tempo de capacidade ociosa e
aumentar o faturamento e lucro. Esta participação da Sanbra na
cadeia algodoeira –uma integração vertical– corrobora a ideia de
Delios e Ma (2010, p. 722) acerca da
maior possibilidade de crescimento do grupo através da
diversificação em atividades relacionadas, até um ponto ótimo em
que os retornos seriam decrescentes.
Por fim, não basta apenas produzir mercadorias. É
necessário que elas cheguem aos pontos de venda e ao consumidor
final. A Sanbra foi construindo uma rede de unidades de vendas
que chegou a nove, estrategicamente distribuídas entre sete
estados, de tal forma que conseguissem atender a demanda de todo
território nacional. Sua documentação assim descreve a logística
de distribuição: “a Sanbra distribui seus produtos para o país
inteiro, através de uma rede de promotorias de vendas próprias,
localizadas no Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Ribeirão Preto,
Bauru, Ourinhos e Santos. O transporte dos produtos é feito
através de ferrovias ou por frota própria de caminhões” (Sanbra, 1970a, pp. 3, 5, 15).
A revista destaca que praticamente todo Brasil era
atendido. A promotoria do Rio de Janeiro atende a Guanabara, o
estado do Rio de Janeiro, do Espírito Santo e o norte de Minas
Gerais. A de Bauru, além da região, atende parte do Mato Grosso.
A de Ourinhos, o Norte do Paraná e parte do Mato Grosso. A de
Ribeirão Preto, o Estado de Goiás. O litoral sul paulista é
atendido pela de Santos e o restante de Minas Gerais pela
promotoria de Belo Horizonte. São Paulo atende a região de
Campinas, o sul de Minas Gerais e o litoral norte do Estado. A
região norte do país é atendida pela filial Sanbra de Recife
(ver mapas 1 e 2).
Mapa 1
Sanbra e
suas atividades administrativas no Brasil, 1972
Fonte: elaboração própria com base
em Sanbra (1960-1985).
Mapa 2
Sanbra e
suas atividades industriais no Brasil, 1972
Fonte: elaboração própria com base
em Sanbra (1960-1985).
Analisando-se os mapas 1 e 2 percebe-se que as principais atividades
da Sanbra estão localizadas em duas regiões: Nordeste e Sudeste.
No Nordeste a firma mantinha fortes atividades tanto do ponto de
vista da recepão de diversas matérias primas (algodão, sisal,
mamona) como para atender, com produtos industrializados, aquela
região e o Norte do Brasil. Os estados de São Paulo e Paraná, no
Sudeste-Sul, concentravam ao mesmo tempo, a recepção de matérias
primas (algodão, café, milho, soja) e representavam o local onde
se encontrava o maior mercado consumidor a nível nacional.
A diversificação de atividades,17 no caso da Sanbra, aconteceu
tanto em direção a outros produtos, além do algodão (milho,
soja, arroz, mamona, oiticica, girassol, gergelim, dendê, sisal,
café, exportações), como na industrialização e lançamento de
novas mercadorias, evidência demonstrada pela descrição de uma
de suas fábricas, a de Jaguaré, em São Paulo.
Em 1960, a Sanbra iniciou, no bairro de Jaguaré, na
cidade de São Paulo, em um terreno de 180 000 m2, a
construção de um parque industrial. “Ele compreendia as fábricas
de: margarina; gordura; sabão e sub-produtos industriais;
refinaria de óleos comestíveis; unidade de extração de óleo de
mamona; e cinco laboratórios para controle de qualidade e
pesquisa” (Sanbra, 1970b, p. 6).
Em 1961, o parque industrial do Jaguaré contava com 22
000 m² de área construída e iniciou o refino de óleo de
amendoim. Em 1962, começou a fabricação de margarina. Em 1967,
entrou em funcionamento a fábrica de imidazolinas, que permitem
a produção de inibidores de algas, emulsionantes para asfalto,
auxiliares têxteis.
A Sanbra, que já produzia óleo vegetal desde a década
de 1930, com as marcas Salada e Delícia,
aumentou a produção, a partir da expansão da soja, lançando o
óleo Soberbo em 1966 e, no ano seguinte, o óleo
Primor, ambos de soja e o óleo Pérola,
de milho. No campo das margarinas, possuía a Delícia,
lançada em 1962 à qual juntou-se a Primor, a partir de
1967.
Um produto exótico para onde a Sanbra diversificou suas
atividades foi a semente de oiticica, da qual passou a extrair o
óleo na fábrica de Sapé, em 1962, cujas instalações transferiu
para o Parque Industrial de Campina Grande, na Paraíba. Já a
planta industrial de Recife, no início da década de 1970,
“contava com 500 funcionários e produzia óleos comestíveis à
base de sementes oleaginosas de caroço de algodão, amendoim,
soja, girassol, gergelim, com uma capacidade de produção de 40
000 toneladas-ano” (Sanbra, 1971, p. 7).
A diversificação de atividades da Sanbra reflete a
política adotada pela Bunge Brasil em sua atuação geral e com as
demais empresas: “[a Bunge] processa produtos como soja e trigo,
comercializa açúcar, produz fertilizantes, fabrica produtos
alimentícios (óleos, gorduras vegetais e margarinas), fornece
farinha de trigo e pré-misturas para o setor de transformadores
(indústrias de panificação e alimentação fora do lar) e fornece
serviços portuários” (Sediyama et al., 2013, p.
173).
Por vezes, a diversificação de atividades aparecia por
obrigação legal, como foi a atividade da Sanbra em
reflorestamento. Com este objetivo e, “atendendo às disposições
da Lei 4.771, arts. 2018 e 21, de
15 de setembro de 1965 e Portaria n. 2.919 de 31 de junho de
1972, a Sanbra iniciou atividades de reflorestamento no Estado
de São Paulo. Para este fim, arrendou 1 816 hectares de terra e
já iniciou o plantio de 4 540 000 árvores” (Sanbra, 1973c, p. 20).
A tabela 3 sistematiza a
diversificação empreendida pela Sanbra e que a levou a atuar em
doze atividades diferentes, mas relacionadas, ajudando a
compreender como ocupou o território nacional, através de sua
presença em doze estados. Esta atuação espalhada pelo país veio
como uma resposta às demandas regionais que puderam ser
abastecidas pela Sanbra. Neste sentido, para criar suas novas
estruturas produtivas nos Estados, aproveitava-se do
fornecimento local de matérias-primas, mas também, de sua
expertise, mão-de-obra já treinada, capitais acumulados,
capacidades que, como Guillén (2000) e Colpan, Hikino e Lincoln (2010, p. 43)
demonstram, davam uma vantagem competitiva e um maior poder de
mercado aos grupos econômicos.
Tabela 3
Sanbra e suas atividades no Brasil, 1980
Itens/Estados |
BA |
DF |
CE |
GO |
MS |
MG |
PB |
PR |
PE |
RN |
RJ |
SP |
Total |
Agências de compras de
mat-primas |
4 |
– |
1 |
1 |
1 |
– |
2 |
12 |
4 |
1 |
– |
10 |
36 |
Beneficiamento de algodão |
– |
– |
1 |
2 |
1 |
2 |
2 |
5 |
2 |
2 |
– |
9 |
26 |
Fábrica óleos comestíveis
e industriais |
1 |
– |
– |
– |
– |
– |
1 |
2 |
1 |
– |
– |
2 |
7 |
Refinarias de óleos
comestíveis |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
1 |
– |
– |
1 |
2 |
Fábricas de margarinas e
gorduras |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
1 |
– |
– |
1 |
2 |
Fábricas de sabão |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
1 |
– |
– |
1 |
2 |
Fábrica de sorvetes |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
1 |
– |
1 |
Padronização de café |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
2 |
– |
– |
– |
1 |
3 |
Terminal graneleiro |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
1 |
– |
– |
– |
|
1 |
Filiais e escritórios |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
1 |
1 |
– |
1 |
1 |
4 |
Unidades de vendas |
1 |
1 |
1 |
– |
– |
1 |
– |
– |
1 |
– |
1 |
4 |
10 |
Fábrica de derivados de
mamona |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
1 |
1 |
Total |
6 |
1 |
3 |
3 |
2 |
3 |
5 |
23 |
12 |
3 |
3 |
31 |
95 |
Na análise da tabela 3, chamam
atenção diversos aspectos. O primeiro é a tentativa da Sanbra de
acompanhar o desenvolvimento das atividades econômicas nos
diversos Estados. Tendo começado suas atividades no Nordeste e
para trabalhar com algodão e derivados atuava, em 1980, em doze
Estados, com destaque para São Paulo, Paraná, Pernambuco e
Bahia.
O Nordeste continuou sendo importante, em função das
atividades com algodão, sisal, oiticica, mamona e derivados. No
entanto, os dois Estados que concentraram a atuação da Sanbra
foram São Paulo e Paraná. Neste caso, o algodão, acompanhando a
origem da empresa, foi o motivo inicial, entretanto, dois outros
produtos contribuíram para atrair a Sanbra a esta região: café e
soja. No último caso, a Sanbra atuou tanto na compra como na
industrialização e geração de subprodutos, destinados ao mercado
interno e às exportações.19
No Rio de Janeiro, que era pouco representativo na
produção de algodão e soja, a presença da Sanbra justificava-se
pela diversificação de produtos destinados ao mercado carioca.
Foi nas proximidades daquela cidade que a firma instalou sua
primeira fábrica de sorvetes para atender a demanda interna e
externa.
Outro destaque é a quantidade de lugares onde a Sanbra
estava presente em 1980. Trata-se de 95 atividades econômicas em
diferentes cidades, regiões ou estados. Esta capilaridade
contribuiu para estar presente nos principais centros de
produção de matéria prima, assim como estabelecendo pontos de
distribuição de seus derivados para atingir a demanda do mercado
interno, uma vez que se trata de um país de dimensões
continentais.
Sanbra: o
reinvestimento do capital próprio
O aumento da receita como do lucro foi uma das fontes
que permitiu à Sanbra reinvestir em coligadas e no seu próprio
parque industrial (ver tabela 4). Outra
observação é que, além do reinvestimento, por se tratar de uma
empresa de capital aberto, lançava ações que depois distribuíam
os lucros aos seus detentores.
Tabela 4
Sanbra: Receita, lucro e lucro por ação
1973-1984 (Valor em dólares americanos, april, 2016)
Anos/Itens |
Receita operacional
bruta
(1 000 dólares) |
Lucro líquido
(1 000 dólares) |
Lucro por ação
(lote de 1 000 ações) (dólares) |
1973 |
1 756 |
13 311 |
2 |
1974 |
2 390 |
23 131 |
3 |
1979 |
1 629 |
16 142 |
0 |
1980 |
1 721 |
-9 056 |
0 |
1981 |
2 056 |
74 614 |
0 |
1982 |
1 938 |
89 094 |
0 |
1983 |
1 916 |
144 897 |
0 |
1986 |
2 129 |
49 362 |
15 |
1987 |
1 392 |
43 871 |
14 |
1988 |
1 056 |
66 310 |
21 |
1989 |
748.8 |
105 040 |
33 |
1990 |
769.1 |
18 466 |
6 |
1991 |
792.7 |
96 331 |
30 |
1992 |
618.3 |
29 873 |
9 |
Dos investimentos em coligadas é uma forma de garantir
a diversificação de atividades, ocupar o território nacional,
ofertar novas mercadorias e atender a demanda de diversos
setores de consumo (ver tabela 5).
Tabela 5
Sanbra: Investimentos em empresas
coligadas e controladas, 1980-1984 (Participação no
capital em porcentagem; Valor investido em 1 000
dólares, abril, 2016)
Anos |
1980 |
1981 |
1982 |
1983 |
1984 |
Empresas |
Participação no
capital |
Valor
investido |
Participação no
capital |
Valor
investido |
Participação no
capital |
Valor
investido |
Participação no
capital |
Valor
investido |
Participação no
capital |
Valor
investido |
Compania Brasileira de
Armazéns Gerais |
48 |
22 790 |
48 |
21 497 |
10 |
4 850 |
10 |
4 324 |
10 |
4 226 |
Imobiliária Olimpus |
21 |
9 329 |
21 |
5 672 |
21 |
4 567 |
21 |
3 537 |
21 |
3 528 |
Lubeca Administradora de
Bens |
32 |
65 370 |
47 |
104 919 |
42 |
104 876 |
42 |
85 374 |
42 |
87 902 |
Maranhense Agropecuária e
Industrial |
69 |
3 222 |
s. d. |
0 |
s. d. |
0 |
s. d. |
0 |
s. d. |
0 |
Sanbra Agropecuária e
industrial |
91 |
5 118 |
92 |
10 716 |
s. d. |
0 |
s. d. |
0 |
s. d. |
0 |
Santista Ind. Têxtil do
Nordeste |
3 |
3 425 |
4 |
4 531 |
4 |
5 055 |
4 |
4 605 |
1 |
1 228 |
S. A. Moinho Santista
Ind. Gerais |
s. d. |
0 |
s. d. |
0 |
3 |
20 333 |
3 |
19 848 |
3 |
22 263 |
S. A. Moinhos
Riograndenses |
16.1 |
39 401 |
16 08 |
36 981 |
16 |
35 762 |
16 |
35 527 |
16 |
39 760 |
Tintas Coral |
50.0 |
63 802 |
50 |
80 000 |
50 |
98 405 |
50 |
84 899 |
50 |
80 512 |
Toália Industria Têxtil |
s. d. |
0 |
s. d. |
0 |
s. d. |
0 |
3 |
1 372 |
s. d. |
0 |
Vera Cruz Seguradora |
21.9 |
15 692 |
11 |
18 259 |
9 |
18 922 |
9 |
17 943 |
9 |
15 742 |
Outras |
s. d. |
5 385 |
s. d. |
5 312 |
s. d. |
4 259 |
s. d. |
2 348 |
s. d. |
2 242 |
Total |
s. d. |
236 443 |
s. d. |
287 889 |
s. d. |
305 370 |
s. d. |
259 778 |
s. d. |
257 404 |
Contando com as Tintas Coral20 (onde a Sanbra tinha cerca de 50%
do capital) e a Lubeca Administradora de Bens (cerca de 40% do
capital), percebe-se que, tomando o ano de 1984, os
investimentos nas Tintas Coral foram de 31.3%, enquanto na
Lubeca Administradora de Bens foi de 34.3% representando, em
ambas, 65.6% do total. Portanto, as maiores inversões em
coligadas concentraram-se naquelas em que a Sanbra era acionista
majoritária ou tinha mais ações investidas. Por outro lado,
chamam a atenção, os investimentos na S. A. Moinho Santista
Indústrias Gerais e S. A. Moinhos Riograndenses que, somados,
significaram 24.1% do total. Neste caso, mais significativo
ainda, pois trata-se de outras duas subsidiárias do grupo Bunge
Brasil e onde a multinacional é acionista majoritária.
Analisando os dados da Sanbra nas tabelas 3 e 4
percebe-se que ela se preocupou em gerar riqueza para ser
reinvestida e aplicou recursos em outras firmas coligadas, além
de imobilizar capital em terrenos, edifícios, máquinas e
equipamentos. Esta capacidade de mobilização de capitais
próprios por parte da Sanbra para se expandir e, ao mesmo tempo,
robustecer a acumulação de sua holding, a Bunge Brasil, é
atinente ao que Morck (2010) propõe sobre a
aptidão dos grupos econômicos piramidais, formados pelas
respectivas subsidiárias, em atuar em diversos setores, gerar
capitais e mitigar as crises do grupo, sobretudo considerando as
eventuais dificuldades no acesso ao crédito em economias em
desenvolvimento.
Sanbra e a
industrialização por substituição de importações
O processo de industrialização de nações
latinoamericanas, como o Brasil, adotou a industrialização por
substituição de importações como seu fio condutor. Neste modelo,
ocorre uma tentativa por etapas, lideradas pelo Estado, da
formação de um tecido industrial completo dentro da nação,
protegendo as empresas já existentes –por exemplo, via tarifas
de importação sobre bens de consumo assalariados– para que
ocupem faixas maiores da oferta nacional e, dessa forma, as
divisas possam ser direcionadas para setores industrais em
formação, caso dos bens de capital e intermediários.21
Neste processo dinâmico da substituição de
importações, o Estado tem um papel fundamental ao articular as
alianças entre suas empresas estatais, o capital privado
nacional e o capital estrangeiro. No Brasil, esta articulação
ficou clara durante a implementação do projeto industrializante
do governo Juscelino Kubitschek (1956-1961): o Plano de Metas,
com seus investimentos em energia (42% da estimativa do total a
ser investido), transporte (29%), indústria básica (22%),
alimentação (4%) e educação (3%) (Draibe, 1985,
p. 241; Orenstein e Sochaczewski, 1989,
p. 177).22
O setor público seria o grande responsável pelo
financiamento do Plano, cabendo a ele 50% dos desembolsos. O
capital privado, tanto nacional quanto estrangeiro, seria
estimulado a investir a partir do financiamento estatal vindo de
bancos públicos nacionais, o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico y Social (bndes) criado em 1952, além do crédito vindo do
Banco do Brasil.23 Estes capitais
deveriam voltar-se às áreas prioritárias elencadas no Plano e,
na medida do possível, direcionando o crédito ao capital privado
nacional, uma vez que, o bndes concedia avais para que as subsidiárias de
empresas estrangeiras pudessem captar financiamento no exterior
(Orenstein e Sochaczewski, 1989, p.
177; Willis, 2014).24
A disputa pelos financiamentos do bndes era intensa,
pois estes créditos tinham uma taxa de juros de 11% ao ano,
enquanto a inflação entre 1956-1960, teve média de 25% no
Brasil, determinando um subsídio ao investimento industrial.
Para obtenção dos empréstimos, mais importante até que a origem
do pleiteante –pois, a priori, não haveria uma restrição ao
capital estrangeiro– era enquadrar os projetos aos setores
entendidos como prioritários pelo banco: metalurgia do cobre, do
alumínio e suas ligas; siderurgia (aços especiais); produção de
ácido sulfúrico; produção de amoníaco sintético; produção de
álcalis; indústria de fertilizantes; indústria de material
elétrico pesado; indústria de material ferroviário; indústria de
máquinas agrícolas e veículos automotores (Banco
Nacional de Desenvolvimento Económico e Social [em diante
bndes], 1996, pp. 94-97).
O empréstimo obtido pela Sanbra no valor de 200 000
000 de cruzeiros, em que pese não ter sido o maior dentre os
valores financiados, foi ilustrativo do peso exercido por um
grupo econômico em meio ao projeto industrializante brasileiro.
Como verificou-se antes, a Sanbra utilizou os capitais do bndes para a
construção do parque industrial do Jaguaré, na cidade de São
Paulo, em uma planta industrial de 22 000 m² cuja finalidade
era: refino de óleo de amendoim, fabricação de margarina,
fábrica de imidazolinas e óleos, ou seja, atividades que não
seriam prioritárias, de acordo com as arroladas inicialmente
pelo bndes.
Ademais, a maioria das empresas era de capital nacional e a
Sanbra, por sua vez, era uma subsidiária da Bunge Brasil que,
não se deve olvidar, era vinculada ao grupo Bunge y Born da
Argentina.
O fato de não estar entre as áreas industriais
prioritárias do Plano de Metas fazia com que uma alternativa
fosse enquadrar o projeto como atendimento ao capital nacional,
condição que também não era atendida pela Sanbra na visão dos
técnicos do bndes,
que alegavam ser um grupo multinacional. Estes dois argumentos
basearam a negativa dos técnicos aos empréstimos (Willis, 2014).
filosófica ocorreu na aprovação do
projeto da Sanbra. O projeto da Sanbra, que era uma
multinacional, foi aprovado [...]. Mas houve uma longa e
complexa discussão na diretoria entre o Sr. Roberto Campos
e o Dr. Ewaldo Correia Lima, então diretor substituto –e
aí foram aos fundamentos da economia, foi uma discussão
realmente memorável. O projeto da Sanbra foi aprovado na
diretoria –e aí eu estou falando de memória, posso estar
equivocado– por três a dois. Foi realmente uma discussão
filosófica em termos do conceito de desenvolvimento
econômico e se era importante financiar projetos de
capital estrangeiro ou não... (bndes,
1996, p. 96).
A negativa dos técnicos ao projeto da Sanbra foi
revertida na diretoria do banco por margem apertada –três votos
a dois– e contou com dois apoios importantes, além do próprio
presidente do bndes, Roberto Campos, que defendia a entrada mais
robusta do capital estrangeiro na industrialização nacional (Madi, 2007, pp. 368-370). Um dos
apoiadores foi Augusto Frederico Schmidt, prestigiado assessor
do governo Juscelino Kubitschek –era assessor de Relações
Internacionais– e que tinha um escritório na cidade do Rio de
Janeiro que prestava consultoria técnica às empresas
estrangeiras que queriam investir no Brasil. Sua amizade com
Juscelino lhe permitiu solicitar ao presidente que usasse de sua
influência para modificar a decisão dos técnicos do bndes e, dessa
forma, levar ao resultado final favorável ao empréstimo para a
Sanbra (Calicchio, 2001; Willis, 2014).
Este resultado monstra como a intimidade política foi
elemento favorável à expansão dos grupos econômicos em meio ao
processo de industrialização por substituição de importações,
como apontam Schneider (2010, pp. 658-659) e
Guillén (2000, p. 366).25 De uma parte, o governo
estimulava a diversificação produtiva, pois mesmo que a Sanbra
concentrasse suas atividades no setor de processamento de
alimentos, devemos considerar que a Bunge Brasil, sua
controladora, tinha uma atividade mais diversificada –como
mostra a tabela 2 no início. Do ponto de vista
do grupo Bunge Brasil, ele encontrava no Estado os recursos
financeiros a um menor custo de captação se comparado ao mercado
creditício de uma nação em desenvolvimento, o que está indicado
na tabela 6. Mesmo assim a Bunge recorreu
tanto a financiamento interno como externo.
Tabela 6
Projetos aprovados pelo BNDE no
ano de 1960 (valores em milhares de cruzeiros)
Entidades
Financiadas |
Valor |
Estado |
Descrição |
> Farloc do Brasil, S.
A. |
19 158 |
Rio de Janeiro |
Indústria |
> Ishikawajima do
Brasil, S. A. |
500 000 |
Rio de Janeiro |
Indústria |
> Ishikawajima do
Brasil, S. A. |
145 000 |
Rio de Janeiro |
Indústria |
> Força e Luz do Pará,
S. A. |
319 000 |
Pará |
Energia |
> Sociedade
Algodoeira do Brasil (Sanbra) |
200 000 |
São Paulo |
Indústria |
> Indústria de Papel
Simão, S. A. |
160 000 |
São Paulo |
Indústria |
> Usina Termelétrica
de Figueira (Utelfa) |
273 000 |
Santa Catarina |
Energia |
> Empresa Sul
Brasileira de Energia, S. A. |
39 700 |
Santa Catarina |
Energia |
> Santa Lucia
Cristais, S. A. |
27 000 |
São Paulo |
Indústria |
> Frigorífico Mouran,
S. A. |
46 500 |
São Paulo |
Indústria |
> Fiação Brasileira de
Sisal (Fibrasa) |
20 500 |
Paraíba |
Indústria |
> Centrais Elétricas
Matogrossenses, S. A. |
594 000 |
Mato Grosso |
Energia |
> Companhia Vale do
São Francisco (Três Marias) |
580 000 |
Minas Gerais |
Energia |
> Companhia Comércio e
Navegação |
477 000 |
Rio de Janeiro |
Portos e navegação |
> Administração do
Porto do Rio de Janeiro |
200 000 |
Distrito Federal |
Portos e navegação |
> Cobrasma |
41 000 |
São Paulo |
Indústria |
> Escelsa |
268 087 |
Espírito Santo |
Energia |
> Peixoto Gonçalves
Navegação, S. A. |
20 000 |
Sergipe |
Portos e navegação |
> Mafrisa-Matad.
Frirgorífico, S. A. |
123 000 |
São Paulo |
Indústria |
> Central Elétrica do
Piauí |
26 730 |
Piauí |
Energia |
Esta fusão de capital próprio com acesso ao crédito
institucional, interno ou externo, era que possibilitava aos
grandes grupos econômicos uma expansão contínua em economias que
se encontravam em formação (Guillén, 2000, p.
367).26
Sanbra e sua
atuação no mercado interno e externo
O viés exportador da Bunge Brasil, controladora da
Sanbra, vinha desde a década de 1930, com a venda ao mercado
europeu de algodão em pluma sendo que, atualmente, o grupo é o
principal exportador do agronegócio brasileiro (Bunge. Brasil, 2012). As exportações que começaram
pelo algodão, depois também foram para outros produtos, tanto em
forma de matérias primas como subprodutos industrializados.27
em 1960 começamos as exportações
de café após cuidadosos estudos desta atividade, desde a
compra ao produtor até a instalação de máquinas
beneficiadoras. Estas foram instaladas nos centros de
produção, como Catanduva, Valparaíso, Maringá e Cianorte,
nos estados de São Paulo e Paraná. Para viabilizar as
exportações, abrimos filial em Santos e um departamento de
café na nossa filial do Rio de Janeiro (Sanbra (1960-1986: 1960, p. 6).
A partir da década de 1970, as exportações da Sanbra
estavam consolidadas tanto a nível de produtos como na logística
de embarque: “Mensalmente saem dos portos da Sanbra de 35 a 60
navios transportando fibra de algodão, óleo de mamona, café,
milho, sisal, amendoim, soja e farelos em geral. Os 1971
embarques são realizados nos portos de Santos, Paranaguá, Rio de
Janeiro, Natal, Recife e Fortaleza” (Sanbra,
1972, p. 6).
Uma vez consolidadas as exportações em diversos
produtos e a partir dos principais portos, a Sanbra tornou-se
uma das maiores exportadoras nacionais28 (ver tabela 7).
Tabela 7
Maiores empresas exportadoras
brasileiras em 1971
Empresa |
Participação
(em 1 000 dólares) |
Percentagem |
Empresa |
Participação
(em 1 000 dólares) |
Percentagem |
Compañia Vale do Rio Doce |
190.7 |
6.63 |
Compañia Vale do Rio Doce |
190.7 |
6.63 |
Compañia Vale do Rio Doce |
190.7 |
6.63 |
Compañia Vale do Rio Doce |
190.7 |
Instituto do Açúcar e do
Álcool |
146.7 |
5.10 |
Instituto do Açúcar e do
Álcool |
146.7 |
5.10 |
Instituto do Açúcar e do
Álcool |
146.7 |
5.10 |
Instituto do Açúcar e do
Álcool |
146.7 |
Sanbra |
85.2 |
2.96 |
Sanbra |
85.2 |
2.96 |
Sanbra |
85.2 |
2.96 |
Sanbra |
85.2 |
Petrobras |
39.9 |
1.39 |
Petrobras |
39.9 |
1.39 |
Petrobras |
39.9 |
1.39 |
Petrobras |
39.9 |
Industria e Comercio de
Minérios, S. A. |
36.4 |
1.26 |
Industria e Comercio de
Minérios, S. A. |
36.4 |
1.26 |
Industria e Comercio de
Minérios, S. A. |
36.4 |
1.26 |
Industria e Comercio de
Minérios, S. A. |
36.4 |
Sociedade Anónima
Frigorífico Anglo |
30.2 |
1.05 |
Sociedade Anónima
Frigorífico Anglo |
30.2 |
1.05 |
Sociedade Anónima
Frigorífico Anglo |
30.2 |
1.05 |
Sociedade Anónima
Frigorífico Anglo |
30.2 |
Anderson Clayton S. A.
Industria e Comércio |
26.9 |
0.93 |
Anderson Clayton S. A.
Industria e Comércio |
26.9 |
0.93 |
Anderson Clayton S. A.
Industria e Comércio |
26.9 |
0.93 |
Anderson Clayton S. A.
Industria e Comércio |
26.9 |
Compañia Swift do Brasil |
25.4 |
0.88 |
Compañia Swift do Brasil |
25.4 |
0.88 |
Compañia Swift do Brasil |
25.4 |
0.88 |
Compañia Swift do Brasil |
25.4 |
Frigorífico Bordon |
24.1 |
0.83 |
Frigorífico Bordon |
24.1 |
0.83 |
Frigorífico Bordon |
24.1 |
0.83 |
Frigorífico Bordon |
24.1 |
Frigorífico Armour |
21.1 |
0.73 |
Frigorífico Armour |
21.1 |
0.73 |
Frigorífico Armour |
21.1 |
0.73 |
Frigorífico Armour |
21.1 |
Empresa |
Participação
(em 1 000 dólares) |
Percentagem |
Empresa |
Participação
(em 1 000 dólares) |
Percentagem |
Empresa |
Participação
(em 1 000 dólares) |
Percentagem |
Empresa |
Participação
(em 1 000 dólares) |
Compañia Vale do Rio Doce |
190.7 |
6.63 |
Compañia Vale do Rio Doce |
190.7 |
6.63 |
Compañia Vale do Rio Doce |
190.7 |
6.63 |
Compañia Vale do Rio Doce |
190.7 |
Instituto do Açúcar e do
Álcool |
146.7 |
5.10 |
Instituto do Açúcar e do
Álcool |
146.7 |
5.10 |
Instituto do Açúcar e do
Álcool |
146.7 |
5.10 |
Instituto do Açúcar e do
Álcool |
146.7 |
Sanbra |
85.2 |
2.96 |
Sanbra |
85.2 |
2.96 |
Sanbra |
85.2 |
2.96 |
Sanbra |
85.2 |
No setor algodoeiro, as duas maiores empresas eram a
Sanbra e a Anderson Clayton (grupo estadunidense), estavam entre
as maiores exportadoras nacionais nos anos 1970 (ver tabela 7). O domínio destas duas firmas
sobre a produção e o beneficiamento do algodão era tido como um
monopólio por parte de produtores e políticos nacionais, que
condenavam tais práticas desde meados da década de 1930.29
As exportações da Sanbra tinham como destaque o café
que, nos anos 1970, ainda era o principal produto na pauta
exportadora nacional (ver tabela 8). Apesar da
Sanbra responder por apenas 1.5% das exportações em 1980, foi
onde mais faturou no comércio internacional. Em contrapartida,
seu índice de exportação mais elevado foi na venda de óleo de
mamona onde, entretanto, seu retorno monetário foi pouco
significativo.
Tabela 8
Exportações de produtos selecionados do
Brasil, da Sanbra e participação relativa (em
Percentagem) da Sanbra em relação às exportações
nacionais, 1972-1980 (em 1 000 dólares)
Ano |
Brasil/Sanbra/
Porcentagem Sanbra
|
Algodão |
Milho |
Café |
Soja em
grão |
Subprod.
Oleagin. |
Óleo de
mamona |
Óleos
comestív. |
1972 |
Porcentagem Sanbra |
16.5 |
21.0 |
4.9 |
s. d. |
19.4 |
35 |
34.5 |
1973 |
Brasil Sanbra
Porcentagem Sanbra
|
197 121 35 679
18.1
|
7 955 1 790
22.5
|
1 045 454 46 000
4.4
|
s. d. |
193 262 28 023
14.5
|
53 883 14 818
27.5
|
41 791 8 400
20.1
|
1974 |
Brasil Sanbra
Porcentagem Sanbra
|
218 077 33 584
15.4
|
s. d. |
1 345 000 53 800
4.0
|
506 900 25 345
5.0
|
447 965 77 946
17.4
|
123 043 39 743
32.3
|
55 407 10 195
18.4
|
1975 |
Brasil Sanbra
Porcentagem Sanbra
|
90 934 22 639
24.9
|
138 265 8 044
5.8
|
1 002 000 34 500
3.5
|
583 916 16 960
3.0
|
308 067 72 365
23.5
|
128 425 40 813
32.5
|
s. d. |
1976 |
Brasil Sanbra
Porcentagem Sanbra
|
96 100 29 200
30.4
|
150 838 7 978
5.7
|
– |
684 900 5 560
0.8
|
468 786 94 462
18.7
|
52 000 14 265
28.0
|
184 254 26 475
14.0
|
1977 |
Brasil Sanbra
Porcentagem Sanbra
|
9 832 4 240
43.4
|
164 678 21 475
13.2
|
959 259 200 25 900
2.7
|
803 125 1 285
0.16
|
806 278 133 036
16.5
|
78 000 24 800
31.7
|
263 149 24 365
9.3
|
1978 |
Brasil Sanbra
Porcentagem Sanbra
|
40 894 19 092
46.7
|
135 668 6 138
4.5
|
2 315 223 62 550
2.7
|
s. d. |
1 162 281 152 637
13.1
|
84 497 25 400
29.0
|
312 557 34 086
10.9
|
1979 |
Brasil Sanbra
Porcentagem Sanbra
|
52 760 21 350
40.46
|
s. d. |
1 939 836 25 000
1.29
|
s. d. |
1 060 274 111 189
10.48
|
110 124 30 000
27.26
|
334 894 21 179
6.32
|
1980 |
Brasil Sanbra
Porcentagem Sanbra
|
2 685 485
18.06
|
s. d. |
1 835 205 27 594
1.50
|
s. d. |
1 159 414 97 093
8.37
|
88 037 49 948
56.74
|
352 195 29 314
8.32
|
As exportações da empresa mostram também seu poder de
inovação e lançamento de novos produtos. “Alemanha Ocidental,
Inglaterra, China, Peru e Argentina começaram a receber, em
1973, as primeiras remessas de lecitina de soja produzida no
complexo industrial de Ponta Grossa-PR. Os portos de Santos,
Paranaguá e Porto Alegre, estão exportando um total de 100
ton-mês” Sanbra (1973d, p. 17).
Analisando vinte anos do faturamento da Sanbra
(1962-1984), percebe-se que as exportações lhe renderam uma
média de 40.1% do faturamento total, com picos de 49.8% na
década de 1960 (ver tabela 9). Este papel
gerador de divisas era fundamental à industrialização por
substituição de importações, ao permitir deslocar cambiais para
a importação máquinas, equipamentos e insumos (Fishlow, 2013, p. 28). Entretanto, no início da
década de 1990, notamos que houve uma tendência declinante na
importância das exportações, que se fixaram ao redor de 22 por
cento.
Tabela 9
Sanbra: Faturamento total, Brasil e
exterior (1962-1984) (em dólares de abril de 2016)
Anos |
Total |
Brasil |
Porcentage
Brasil |
Exterior |
Porcentage
exterior |
1962 |
535 241 136 |
320 462 934 |
58.1 |
21 4778 203 |
41.9 |
1963 |
470 188 778 |
283 064 034 |
59.8 |
187 124 743 |
40.2 |
1964 |
673 804 637 |
406 184 786 |
60.2 |
267 619 851 |
39.8 |
1965 |
701 030 677 |
409 190 829 |
58.3 |
291 839 841 |
41.7 |
1966 |
494 099 437 |
445 316 148 |
58.4 |
340 793 878 |
41.6 |
1967 |
823 363 070 |
494 748 826 |
56.6 |
328 614 244 |
43.4 |
1968 |
1 195 274 807 |
652 619 979 |
60.1 |
542 654 828 |
39.9 |
1969-1970 |
136 043 547 |
718 052 967 |
54.6 |
642 380 581 |
45.4 |
1970-1971 |
1 483 829 994 |
787 951 508 |
56.2 |
695 530 129 |
43.8 |
1971-1972 |
1 756 593 026 |
1 059 924 322 |
53.1 |
696 668 705 |
46.9 |
1972-1973 |
2 390 591 346 |
1 221 978 107 |
60.3 |
1 168 613 240 |
39.7 |
1973-1974 |
2 321 916 532 |
1 545 951 635 |
51.1 |
775 964 897 |
48.9 |
1974-1975 |
1 918 356 707 |
1 218 205 873 |
66.6 |
700 151 243 |
33.4 |
1975-1976 |
2 315 993 037 |
1 421 853 140 |
63.5 |
894 139 897 |
36.5 |
1976-1977 |
2 112 649 115 |
1 298 637 057 |
61.4 |
81 401 2058 |
38.6 |
1977-1978 |
1 626 345 525 |
1 089 584 331 |
61.5 |
92 6949 779 |
38.5 |
1978-1979 |
193 4330 550 |
1 405 687 220 |
67.0 |
52 8643 331 |
33.0 |
1982 |
1 946 908 992 |
126 2273 353 |
72.6 |
650 326 1245 |
27.3 |
1983 |
2 054 080 630 |
1 457 394 729 |
65.6 |
596 685 902 |
34.4 |
1984 |
1 873 731 495 |
1 351 667 479 |
70.9 |
522 064 016 |
29.1 |
1986 |
323 125 531 |
223 734 850 |
72.1 |
99 390 680 |
27.9 |
1987 |
2 872 239 975 |
1 866 015 226 |
65.0 |
1 006 224 749 |
35.0 |
1988 |
2 767 503 000 |
1 839 827 000 |
66.5 |
927 677 000 |
34.5 |
1989 |
2 631 254 994 |
1 942 432 598 |
73.8 |
688 822 396 |
26.2 |
1990 |
8 912 599 675 |
6 835 591 184 |
76.7 |
2 077 008 491 |
23.3 |
1991 |
1 841 306 393 |
1 388 445 137 |
75.4 |
452 858 199 |
24.6 |
1992 |
1 698 344 342 |
1 335 166 781 |
78.6 |
363 177 561 |
21.4 |
A queda de faturamento no início da década de 1990 foi
marcada pelo processo de reestruturação das empresas do Grupo
Bunge: Sanbra, Samrig, Moinho Fluminense e Moinho Recife.30 Essas ações tinham como
objetivo focar os investimentos da Bunge em agronegócio e
alimentos. As primeiras mudanças ocorreram quando a Sanbra
incorporou a Samrig e alterou a sua denominação social para
Sanbra Alimentos, S. A., conforme a Assembleia Geral Ordinária e
Extraordinária, de 27 de abril de 1994.
Em 13 de setembro do mesmo ano, a Sanbra Alimentos, S.
A. alterou sua denominação social para Santista Alimentos, S. A.
Após um mês foi incorporada pelo Moinho Fluminense mantendo a
mesma razão social devido à importância da marca no mercado.
Paralelamente, o Moinho Fluminense incorporou as participações
no setor de alimentos do Moinho Recife, S. A. Empreendimentos e
Participações e da S. A. Moinho Santista Indústrias Gerais. A
reestruturação societária iniciada neste ano reduziu o número de
empresas da Bunge de 32 para oito, aumentando o capital social
da companhia. As mudanças tornaram a Santista Alimentos uma das
maiores companhias brasileiras em seu segmento (Bunge. Brasil, 2013, p. 26). Através desta
reestruturação, a Sanbra deixou de existir enquanto empresa
individual e suas atividades foram incorporadas pela Bunge
Brasil.
Considerações
finais
A história da Sanbra é característica de uma empresa que
iniciou atuando apenas no setor de algodão e, com o tempo,
transformou-se num grupo econômico –um grupo dentro de outro, que era
a Bunge Brasil. Conseguiu transformar-se em grupo econômico através,
sobretudo, da diversificação de atividades, reinvestindo o capital
próprio, atuando como uma das companhias que colaborou com a
“industrialização através da substituição de importações”, ocupando o
território nacional, lançando e relançando novos produtos e fazendo-se
presente no mercado internacional através das exportações
A diversificação de atividades levou a Sanbra a atuar, além
do algodão, com outras matérias primas: milho, trigo, café, mamona,
girassol, dendê, amendoim, oiticica, arroz e, já no século xxi, cana de açúcar.
Ademais, ela também diversificou em produtos, entrando em novos
setores, como margarinas, óleos vegetais, sabões e sorvetes.
O reinvestimento do capital próprio foi outra constante na
Sanbra ao buscar constituir-se como grupo econômico. Destaca-se, neste
caso, o investimento em itens fundamentais para a continuidade de seu
crescimento, tais como terrenos, edifícios, máquinas e equipamentos e
“obras em andamento”, que mereceram a maior fatia dos recursos.
Ocupar o território nacional foi outra estratégia. Em 1980,
ela contava com 95 atividades econômicas e estava presente em doze
estados. Suas atividades avançaram para ocupar mais de 100
instalações, entre fábricas, usinas, moinhos, portos, centros de
distribuição e silos, em 17 estados das cinco regiões brasileiras e no
Distrito Federal, em meados da segunda década do século xxi. Além disso, seus
produtos chegavam a cerca de 70% dos lares brasileiros.
Uma das características da Sanbra foi sua atuação no mercado
nacional e internacional. Neste caso, tornou-se uma das maiores
exportadoras do agronegócio e fez das vendas externas um de seus
pontos fortes. No entanto, na medida em que o mercado nacional foi se
consolidando, percebe-se uma nítida mudança de postura, com o declínio
das atividades exportadoras. O auge das exportações ocorreu em
1973-1974, quando representaram 48.9%, caindo para 21.4% no início da
década de 1990.
Através da Sanbra é possível analisar o comportamento de um
grupo econômico presente, há muito tempo no mercado interno.
Percebe-se que atuou preocupada no longo prazo, fazendo com que, em
2014, a filial brasileira representasse 38% do faturamento da Bunge
mundial. Fez isso reinvestindo seu capital, aumentando a capacidade
produtiva, diversificando produtos e lançando novos, ocupando o espaço
nacional, adaptando-se às conjunturas econômico-políticas e, muitas
vezes, apresentando-se como empresa nacional, para beneficiar-se dos
programas dos bancos públicos que ofereciam condições especiais.
Esta prática foi esclarecida no texto através das
negociações levadas a cabo na conquista de empréstimos do bndes durante a década
de 1950, assim como no caso do Banco de Desenvolvimento do Paraná, uma
agência de fomento estatal. Apesar da Sanbra não estar nem entre as
indústrias de base e, muito menos, entre os grupos privados nacionais,
as boas relações com o poder instituído lhe conferiram acesso aos
recursos dos bancos e demais instituições financeiras públicas.
Outro destaque, no caso da Sanbra, é que ela representou um
dos momentos típicos do processo de “industrialização através da
substituição de importações” no Brasil. O país não tinha indústrias
produtoras de óleos vegetais e a Sanbra começou a produzi-los ainda na
década de 1920; importava adubos e a companhia passou à sua produção;
incentivou novos cultivares, com a melhoria nas sementes; incrementou
a produção de outra oleaginosa, a soja e, quando aumentou a produção,
tornou-se uma das maiores esmagadoras, produzindo farelo, torta, óleo,
lecitina e outros derivados.
Esta pesquisa da Sanbra abriu várias outras questões que
poderiam se transformar em novas pesquisas, que passamos a enumerar.
Uma primeira diz respeito ao vínculo que esta firma específica manteve
ao longo de quase um século com sua controladora, a Bunge Brasil. Por
sua vez, a Bunge Brasil estava (pelo menos até a mudança da sede
mundial da Bunge da Argentina para o Brasil em 1975), intimamente
ligada à Bunge y Born argentina.
A segunda questão a ser aprofundada em outras pesquisas diz
respeito à estratégia de diversificação da Sanbra e da Bunge Brasil e
relacioná-la com a diversificação implementada pela Bunge y Born na
Argentina. Ambas as estratégias seguiram, ao que parece, uma
trajetória semelhante, ressalvadas as diferenças e idiossincrasias das
economias dos dois países.
A terceira questão relaciona-se ao processamento das
matérias primas conduzida pela Sanbra. Trata-se de indagar se foi em
função da disponibilidade destas matérias primas às quais a Sanbra
tinha acesso no Brasil, como grande comercializadora de grãos e óleos
vegetais ou, se era mais uma estratégia voltada à agregação de valor
às mercadorias, numa visão de integração vertical.
Um quarto item a destacar é sobre a diversificação da
Sanbra, tanto vertical como horizontal. Isso ocorreu por uma decisão
interna à empresa ou a firma buscou responder às debilidades da
própria economia brasileira e às ‘falhas de mercado’ que dificultavam
seu acesso a insumos industriais essenciais a seu desenvolvimento? Era
mais prático comprar de terceiros ou internalizar atividades
industriais buscando evitar os altos custos de transação e de
contratos?
O quinto item trata do processo de internacionalização da
Bunge, que apresenta-se como um tema bastante complexo e exigiria uma
pesquisa específica. A Bunge já começou sua trajetória relacionando-se
com o mercado internacional de importação-exportação. Foi fundada em
1818 e já em 1859 mudou a sede de Amsterdam para Antuérpia, na
Bélgica, mantendo Amsterdam como a primeira filial internacional. Em
seguida, no final do século xix e início do xx a filial argentina superou em tamanho e rentabilidade
a parte europeia da companhia, sem mencionar o forte crescimento no
mercado estadunidense, asiático e africano. Portanto, as exportações
da Bunge Brasil, assim como seu proceso de internacionalização, estão
dentro deste contexto mais amplo, que deveriam ser estudadas à parte.
Um sexto tema é o estudo de “um grupo econômico –Sanbra–
atuando como subsidiária de outro grupo econômico (Bunge Brasil) que,
por sua vez, era filial de outro grupo econômico, Bunge y Born
argentino”. Trata-se de entender como se deu a evolução destes grupos
em economias periféricas, formando conjuntos com mais de uma centena
de firmas, porém conservando a flexibilidade de uma estrutura
organizacional que é a de uma empresa de empresas. No caso brasileiro,
aliás, nomes como: Sanbra, Moinho Fluminense, Moinho Santista, Tintas
Coral, Santista Têxtil, só para lembrar alguns dos nomes das 127
firmas do grupo nos anos 1990, nada tinham de específico que pudessem
ser identificados ao nome Bunge.